Já escrevi em posts anteriores que a captação de investidores deve ser encarada como uma venda, principalmente nesse post aqui. E acredito cada dia mais nisso. Uma das minhas intenções escrevendo artigos é dissecar o processo de captação e analisar em detalhe cada etapa, melhores práticas e pontos de vista. Neste artigo faço uma reflexão de como a paixão do empreendedor influencia na conquista do investidor.
Em muitos tipos de venda, a paixão do vendedor pode ajudar muito na decisão de quem está avaliando. Funciona como um atalho para a decisão, quando o emocional influencia o que teoricamente não deveria influenciar. Mas existem diversos tipos de situações, com influência em graus e maneiras diferentes.
Geralmente esse tipo de comportamento costuma funcionar melhor em circunstâncias nas quais o coração fala mais alto que a razão. Quatro delas me vêm à cabeça:
a) Compra impulsiva: o tomador de decisão, por medo ou por ganância, acaba realizando a compra.
b) Processo acelerado pelo vendedor: cria-se a urgência de que a compra deve ser realizada rapidamente.
c) Demanda maior que a oferta: a escassez percebida torna o processo mais emocional do que racional.
d) Compra de menor valor: quando o impacto da decisão é baixo, o coração pode falar mais alto.
Os sinais afetivos transmitidos pelo vendedor nessas situações acessam as emoções do comprador de maneira inconsciente através da linguagem corporal, das expressões faciais, do tom da voz e da linguagem verbal utilizada. Estas são verdadeiras armas de conversão de vendas se bem utilizadas.
O processo de captação de investidores, no entanto, tem características opostas às situações listadas acima. São elas:
a) Compra detalhada: o tomador de decisão – investidor – é obrigado a avaliar com muito cuidado cada detalhe da operação de investimento.
b) Processo complexo determinado pelo comprador: além das burocracias formais relacionadas a governo e órgãos competentes, muitos investidores precisam aprovar os investimentos em comitês e negociar longos contratos.
c) Demanda menor que a oferta: existem menos investidores querendo “comprar” startups que empreendedores querendo “vender”. Apenas 1% das empresas que tentam acaba recebendo investimento.
d) Compra de maior valor: o valor dos investimentos geralmente é alto, nenhum fundo investe menos do que R$ 1 milhão.
Logo, é fácil concluir que apelar para as emoções não teria o mesmo efeito.
Por ser uma avaliação muito mais racional, o PREPARO do empreendedor conta mais que a sua PAIXÃO quando ele está atrás de investimento.
Nesse caso, os sinais são transmitidos através de conteúdo e postura profissional. Ou seja, estar preparado significa:
1. Entender muito bem o problema do cliente.
2. Conhecer o mercado de atuação.
3. Apresentar uma projeção financeira coerente com a visão de longo prazo, com a maturidade da empresa e da equipe e com a rodada de investimento.
4. Estudar e respeitar os processos e protocolos relacionados ao processo de captação de investimento.
5. Saber apresentar a oportunidade de investimento de forma simples e objetiva.
6. Responder perguntas com segurança, citando fatos e dados que suportem os argumentos.
Mas a paixão não importa?
Claro que importa! Queremos empreendedor motivados, sempre. Mas se ela não estiver acompanhada desses seis itens que demonstrem o preparo do empreendedor, não vai ajudar muito. Na verdade, pode até atrapalhar. Na maioria das vezes que vemos a paixão sem os sinais de preparo, ela vem acompanhada de imaturidade, arrogância e incompetência.
Como avaliamos a paixão?
Uma boa parte dos sinais de preparo é identificável a distância, baseada nas interações via e-mail ou telefone e nos conteúdos e informações enviadas pelo empreendedor. Mas os sinais mais subjetivos, como a paixão e a empatia, são avaliados presencialmente.
Nossas reuniões com os empreendedores são extremamente importantes nesse sentido. Eu, particularmente, gosto de reduzir as distrações como computador, celular e blocos de notas. Peço para apresentação ser feita sem o auxílio de slides ou coisa parecida, gosto de olhar no olho e observar:
1. A reação às perguntas e às críticas;
2. A motivação e alinhamento com a visão de futuro;
3. A empolgação na hora de falar da equipe;
4. A ansiedade em relação ao crescimento da empresa em comparação as compensações pessoais;
5. A qualidade da paixão, ou seja, se há um sentimento de posse, restritivo e egoísta ou um sentimento aberto, arrojado, mas humilde.
Apesar da subjetividade, a reflexão é importante e tem um impacto muito grande no processo de captação de investidores. Muito mais do que as pessoas acham ou falam sobre o assunto.
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