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Tese de investimento

Os parâmetros comuns e os menos conhecidos de uma tese de investimento

Por 24 de outubro de 2017novembro 5th, 2019One Comment

Uma tese de investimento, no contexto de investidores de startups e fundos de venture capital, é o conjunto de parâmetros que balizam o processo decisório. São os pré-requisitos que as empresas e empreendedores devem apresentar para passar no primeiro filtro dos investidores. Geralmente são protocolos simples, nos quais as respostas qualificam rapidamente uma oportunidade e definem seu avanço ou não para as próximas fases de análise do investidor. Na maioria das vezes, as respostas são quantitativas ou afirmativas.

Os seis parâmetros mais comuns

1. Tamanho da empresa

Investidores são muito objetivos quando se trata do tamanho da empresa. Geralmente esse parâmetro é representado pelo faturamento anual e/ou mensal da companhia. Investidores-anjo, por exemplo, investem em empresas sem faturamento até algumas com dezenas de milhares mensais de receita. Fundos de investimento de capital semente vão das dezenas de milhares até as centenas de milhares de faturamento mensal. Essa especialização acontece principalmente pelo tipo de competências necessárias em cada uma das fases da vida de uma empresa. Sendo assim, procure um investidor que foque no estágio em que você está e já tenha passado por desafios semelhantes aos que sua empresa está passando no momento.

2. Volume do investimento

Esse é um dos parâmetros mais importantes para o investidor e o menos percebido pelo empreendedor. Muitas vezes o empreendedor aborda investidores com intenções de investimento muito distintas das necessidades apresentadas pela empresa. Portanto, sempre pergunte qual é o tamanho do investimento médio de cada investidor antes de abordá-lo. O investimento médio de investidores-anjo no Brasil está em torno de R$ 350 mil e, de fundos de capital semente, R$ 1,7 milhão.

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Um dos artigos mais importantes no mundo de startups de software, relacionando tamanho das empresas, volume de investimento e outros parâmetros, é o SaaS Funding Napkin do investidor alemão Christoph Janz. Mesmo focado no mercado europeu e americano, vale a pena entender a correlação de alguns desses parâmetros.

3. Setor

O desenvolvimento de teses de investimento mais restritas em termos de setor é mais comum nos EUA do que no Brasil. Mas já estamos começando a ver investidores especialistas por aqui. A estratégia de restringir setores não é unanimidade entre investidores, discuto mais sobre o tema nesse artigo. A lista pode conter apenas um setor ou uma dúzia, os investidores podem ter experiência nos setores escolhidos ou apenas algum interesse. Por tudo isso, o empreendedor deve prestar bastante atenção a esse parâmetro.

4. Tecnologia

Hoje, mesmo no Brasil, é possível encontrar startups especializadas nas mais diversas tecnologias. Das mais simples, como aplicativos móveis, até as mais complexas como machine learning ou genética, passando por microeletrônica, química e blockchain. A aposta na inovação mais disruptiva, utilizando a tecnologia mais moderna é uma corrida que nem todos podem vencer. A escolha desse parâmetro é um misto de timing, competências técnicas, volume de oportunidades e disponibilidade de capital humano. Se a sua empresa é uma organização intensiva em tecnologia, a escolha do investidor pode ter muito impacto no sucesso do seu empreendimento. Escolha com cuidado.

5. Modelo de negócios

Assim como o setor e a tecnologia, os investidores escolhem modelos de negócios nos quais se sintam mais confortáveis em auxiliar o empreendedor. Na Bzplan procuramos empresas com modelos de negócios escaláveis, que atuam com venda de software como serviço (SaaS), marketplaces e venda de produtos ou serviços. Mas a característica comum a todas as nossas empresas é que elas vendem para outras empresas, ou seja, são modelos business-to-business (B2B). Não investimos em negócios que vendem ao consumidor final, os famosos business-to-consumer (B2C). Vou escrever mais sobre isso no futuro. De toda forma, mais um importante fator a ser observado pelo empreendedor em busca de investimento.

6. Localização

Fechando a lista dos parâmetros mais comuns e mais divulgados das teses de investimento de investidores de startups, temos a localização. Frequentemente, investidores escolhem certas regiões para investir seu dinheiro. Seja pelo fato de possuírem mais relacionamentos nas regiões escolhidas, o que facilitaria a prospecção de oportunidades, ou pelo fato de estarem mais perto das empresas investidas, facilitando o acompanhamento dos empreendedores.

Investidores nos EUA possuem até mesmo uma regra chamada “50-mile rule”, ou regra das 50 milhas (equivalente a 80 quilômetros). Segundo essa regra, os investidores não devem viajar mais de 50 milhas para gastar seu dinheiro. Autores de um estudo chamado Local bias in venture capital investments”, concluíram que a distância é um fator importante, que afeta a decisão de investimento na medida em que aumenta a assimetria de informação e os custos de monitoramento. Esse fator é mitigado com a formação de grupos de coinvestidores, nos quais um deles está mais próximo da empresa.

Dez parâmetros menos conhecidos

Além dos seis parâmetros citados acima, existem outros fatores em uma tese de investimento que muitas vezes não são declarados. Apesar disso, esses parâmetros possuem uma rotina de decisão muito objetiva, ou a empresa tem ou não tem.

1. Quantidade de sócios

Nesse artigo eu explico porque não gostamos de empresas com fundadores solitários. Assim como a Bzplan, muitos outros investidores possuem essa restrição. O mesmo critério serve para empresas com muitos sócios. Nesses casos, é muito difícil acomodar todos os sócios na equipe executiva, sendo assim, uma parte considerável da sociedade fica de fora da operação. Isso é ruim do ponto de vista do investidor, que deseja motivação máxima para quem está gerenciando a empresa. Quanto maior a parcela de acionistas executivos, maior a probabilidade de sucesso.

2. Arquitetura societária

Aqui a regra é: quanto mais simples, melhor. Pessoas jurídicas, como sócias e estruturas heterodoxas, não são muito bem vistas. Alguns investidores exigem que a empresa se transforme em Sociedade Anônima (S.A.), outros que a empresa crie uma estrutura de holding fora do país, como em Delaware no EUA. Sem essas modificações, nada de investimento.

3. Perfil dos sócios

O número ideal de sócios é de três pessoas. Contudo, se o investidor se deparar com três pessoas do mesmo perfil profissional, pode não ser um bom sinal. O ideal é que os sócios se complementem. Vendas, produto e finanças, as três grandes áreas do conhecimento empresarial devem estar presentes.

4. Estágio de maturidade

Mesmo com o faturamento semelhante, algumas empresas podem estar em estágios de maturidade muito distintos. Já vimos empresas faturando R$ 30 mil por mês com um produto consistente e um processo de vendas redondo. Em contrapartida, já conhecemos empresas faturando R$ 1 milhão por mês totalmente perdidas em termos de visão de longo prazo, governança e escalabilidade da operação.

5. Valuation

Como já escrevi em artigos anteriores, o valuation de uma startup é proporcional à maturidade do time e da empresa. Muitas vezes, o volume de investimento pode estar alinhado com a tese do investidor, mas o valuation fora da realidade. Não é raro nos depararmos com empresas propondo um valuation de dezenas de milhões de reais, mas sem faturamento. A pergunta que o investidor vai se fazer é: eu consigo multiplicar o valor dessa empresa por, no mínimo, dez vezes em cinco anos?

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Quanto mais longe as expectativas de retorno estiverem, pior será o desalinhamento de valuation.

6. Visão de longo prazo

Aqui é preciso lembrar novamente que o objetivo do investidor é multiplicar o seu investimento de forma agressiva. Para enfrentar esse desafio, a visão de longo prazo entre empreendedor e investidor precisa estar alinhada. Todos devem ter consciência para onde estão indo. Só assim para a empresa crescer muito, e muito rápido. Essa visão de longo prazo deve ser uma combinação cuidadosa de inovação, criação de diferenciais competitivos, foco e crescimento acelerado de vendas. Se o investidor perceber que falta algum desses fatores na visão do empreendedor, pode nem seguir adiante.

Nesse aspecto é comum encontrarmos dois tipos de empreendedores. Um que diz que o produto está finalizado e, quando perguntamos o que a empresa estará fazendo no futuro a resposta é “a mesma coisa que faz hoje, com mais clientes”. O outro é o pequeno empreendedor que já possui três ou mais produtos ou linhas de receita e planeja mais algumas nos próximos anos da empresa. Ou seja, nada de foco. Nossa resposta negativa costuma ser muito rápida em ambos os casos.

7. Necessidades além do capital

Sempre pergunto aos empreendedores que nos abordam o que eles querem além do dinheiro. Temos uma preocupação muito grande em apenas investir em empresas que possamos agregar algum valor. Não faz parte da nossa tese investir em algo no qual não temos nada a contribuir. A resposta, muitas vezes, é exatamente aquilo que queremos ouvir e a parceria segue adiante. Mas, em outras ocasiões, o empreendedor precisa de competências que não possuímos ou, ainda pior, diz que não quer nada além do dinheiro. O segundo caso é mais fácil de dizer não. No primeiro, se gostamos do projeto, tentamos enxergar como poderíamos entregar o que o empreendedor quer. Em alguns casos conseguimos, mas em outros não, e partimos para outra.

8. Perfil da rodada de investimento

No mundo ideal, um investidor quer aplicar a maioria de seus recursos em vendas, marketing e desenvolvimento de produto. Entretanto, em algumas situações, vemos empreendedores captando recursos para pagar dívidas, vender parte de suas ações, aumentar salários de sócios, equacionar tributos ou aumentar custos fixos. Investidor nenhum gosta de financiar esses tipos de atividade. Dependendo do caso o “não” é uma certeza.

9. Geografia do mercado-alvo

A questão da geografia do mercado-alvo depende muito do modelo de negócios e do estágio de maturidade da empresa. Em alguns casos, faz sentido uma expansão territorial orgânica, em outros não existem barreiras. O problema é quando existe um descompasso entre o plano da empresa, seu modelo de negócios, maturidade, competências e relacionamento do investidor com a necessidade de capital para tal expansão. Pensar em internacionalização antes mesmo de dominar parte do mercado nacional pode não ser uma boa ideia. Focar numa região extremamente limitada, como uma cidade ou estado, também pode estar desalinhado com a ambição de um investidor.

10. Empatia

Por fim, a avaliação da empatia é o fator mais subjetivo de todos os que apresentei aqui. Apesar disso, existem empreendedores com uma incrível capacidade de gerar antipatia com todas as pessoas com que interage. Seja por arrogância, inconveniência ou falta de educação. Já tivemos diversos casos em que isso aconteceu. Nunca tivemos dúvidas em dizer não. Nossa tese de investimento exige que nós, juntos com os empreendedores, trabalhemos em equipe para alcançar os resultados. Qualquer fator que ameace essa sinergia é um grande ponto de alerta.

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